segunda-feira, 5 de maio de 2014

Um Plantão Qualquer

Acabou de acontecer aqui no serviço. Casos sequenciais de homicídio na metrópole, sem almoçar e já indo pra as 4 da tarde. Digno de uma sexta-feira 13, mas é 14. No último deles, suspeitando que uns vestígios demonstravam um cenário além dos limites do isolamento, resolvi seguir caminhando para além das faixas zebradas na busca de encontrar elementos de interesse para o raciocínio. 

Foi quando uns garotinhos se aproximaram (na verdade eu me aproximei de onde estavam), serelepes, de olhos bem arregalados e brilhantes e me olhavam como quem vê quase uma celebridade, como quem deixava fugir pelos olhos uma admiração:

"Tio, o que é que o senhor está procurando? São as balas?" "Tio, ele passou por ali..." "Tio..."

Pensei em responder ríspido que se fossem dali e que voltassem às suas casas. Mas isso seria muito dolorido para aqueles coraçõezinhos tão alegres em ajudar e fascinados por estarem próximos da rotina e raciocínio dos "CSI" (ênfase nas aspas) e que eles julgam ser um trabalho super e em nada esmagador (doce ilusão!!)

Da minha parte seria outra crueldade se não respeitasse o entendimento e limitação daquelas cabecinhas e que eu os despachasse numa rajada só, lhes contando na cara dura e naquelas condições complicadas quão terríveis eram a alegria e excitação que eles demonstravam dentro de uma realidade tão brutal. Naquele contexto, não lhes ocorria que a verdadeira alegria seria eu estar bem longe deles e das ruas onde moram com suas famílias e seus amigos. Que alegria boa mesmo era que o "CSI" jamais fosse visto perto da esquina de suas casas, banido das periferias novas e das tradicionais da cidade. Cidade que dizem estar linda nas novelas. E foi matutando em alguns segundos na delicadeza e complexidade daquela rápida interação que percebi que por não ter tempo e condição de explicar a verdade das coisas para aquelas crianças, um choro podia armar rapidamente nos meus olhos e a voz certamente ia engasgar em qualquer resposta que lhes desse. Eram apenas pequenos, tão ingênuos da dureza e das engrenagens que estão sendo colocados.

Dei ordem às glândulas lacrimais que se comportassem e engolido o bolo seco da garganta apenas consegui sair com essas palavras:

"Não, meu filho. Não se preocupe. O tio não está procurando nada."

Me diga um algo quem puder: Que país é esse que ao invés de nos mostrarem pipas rasgando os ares, ou um desenho bonito ou, sei lá, algum malabarismo com as mãos e as pernas, as crianças estão se oferecendo para procurar no chão projéteis que vitimaram pessoas???? Que lixo de país nós somos!!! Qualquer outra honra que um país tenha se evapora, derrete, acaba diante da mais COMPLETA HUMILHAÇÃO de admitirmos que crianças vivam assim!!!

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